terça-feira, 28 de junho de 2011

O Padroado do Hospício de Sant’Ana, em Minde (1757)



    (Hospício de Santa Ana dos Frades Arrábidos de Minde, hoje demolido)

Em Novembro de 1757 encontramos o Registo de uma Escritura feita em Lisboa na Nota do Tabelião José António da Silva Freire, de doação e padroado do Hospício de Sant’Ana de Minde, resumido pelo Escrivão Distribuidor:




Doação = O Padre Apolinário dos Anjos ao Hospício da Senhora Sant’Ana que he dos Padres Arrábidos no Lugar de Minde, termo de Porto de Mós = de 30$000 réis cada ano, e 6 alqueires de azeite perpetuamente; com a condição de o doante, e seus sucessores terem o Padroado da Capela-mór do dito Hospício, e jazigo nele, e outros encargos pios; e para a dita renda ser perpétua, declarou o doante ter feito um Vínculo a favor de sua irmaã Maria da Costa; e por morte della há-de a Misericórdia de Torres Novas a continuar a pagar a pensão ao dito Hospício; conforme a escritura que celebrou na dita vila em 28 de Agosto deste ano.
(DGARQ-ADL, Cartório do Distribuidor, Cx. 35, Lv. 118, f. 305)

Este registo exemplifica um caso tardio de nomeação do padroado de uma casa religiosa associado ao vínculo de bens em legado pio, tratava-se esta disposição de uma prática muito comum sobretudo no século XVI e XVII, em que algumas famílias mais ricas, sobretudo nobres, determinavam estabelecer o jazigo familiar na Capela-mór de um importante convento ou mosteiro.

O Hospício de Frades Arrábidos edificado em Minde, no antigo termo da vila de Porto de Mós, hoje concelho de Alcanena, e também designado por Hospício de Santo António ou Hospício de Santa Maria da Arrábida foi, segundo Frei Cláudio da Conceição, no seu Gabinete Histórico, vol. 11, p. 349, fundado com Licença de D. João V, dada em 1731, tendo sido uma das muitas casas religiosas levantadas no reinado do Rei Magnânimo (veja-se no fim deste artigo, extracto com a lista das casas religiosas fundadas no período do reinado de D. João V).

Por outro lado dizia António Jesus e Silva no Jornal "O Portomozense" no início do século XX:
«A fama das virtudes e saber de muitos frades mindericos que habitavam a maior parte dos conventos da Extremadura, os productos das suas fabricas espalhados por todo o paiz, levaram D. João V a mandar construir em Minde, em 1733, um hospicio de arrabidos para n'elle se instruirem os moços mindericos que se quizessem dedicar á vida conventual, e para fabrica de pannos para habitos dos frades.
Com a edificação do mosteirinho, cujo superior gozava do título de reitor, tornou-se Minde uma povoação interessante: seus filhos tornaram-se celebres: de Minde sairam bispos, desembargadores, pregadores regios, examinadores das tres ordens militares, commissarios geraes da Terra Santa, vigarios geraes de bispados, organistas no convento de Mafra, etc.»

De facto embora no Gabinete Histórico o ano da fundação seja referido como 1731, algumas fontes (Mappa de Portugal Antigo e Moderno, e  a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira de Cultura) apontam a fundação do Convento de Santo António de Minde, no ano de 1733.
Na obra El Franciscanismo en la Península Ibérica: balance y perspectivas (Asociación Hispánica de Estudios Franciscanos. Congreso Internacional, Felice Accrocca, María del Mar Graña Cid - 2005), refere-se que o Hospício de Minde foi aberto em 1733, isto baseado no manuscrito revelado por Fr. António Montes Moreira em 1994 Provincia S. Mariae de Arrabida Fratrum Minorum Excalceatorum in Regno Lusitaniae sita”, escrito entre 1741 e 1752 e que contém breve notícia dos 22 conventos, e 9 hospícios e enfermarias dos arrábidos em Portugal.

Parece assim consensual que o Hospício foi fundado com Licença de D. João V em 1731, tendo sido aberto em 1733.

Em 1757 certamente por falta de alguns meios de subsistência os frades acordaram em ceder ao Padre Apolinário dos Anjos e seus descendentes, a Capela-mor da pequena Igreja do seu Hospício para jazigo, garantindo estes nos seus bens uma dotação anual de 30$000 réis e 6 alqueires de azeite.
Terá sido esta falta de meios que terá levado a estabelecer-se em 1758 uma feira em Minde, a Feira de Sant'Ana, cujas rendas deviam ser aplicadas em benefício do hospício, conforme se regista na Mercê de D. José, concedida em 26 de Julho de 1758, que refere o seguinte:
“Faço saber q sendo-me prezente q os Habitantes do lugar de Minde e cas manufacturas q se fabricão Receberão utild.e e aumento de se estabelecer huma feira publica e franca no d.º lugar Hey por Bem que nelle se estabeleça huma feira na sobred.a forma que principiará no dia vinte e sinco e acabará no dia vinte e sete do mez de Julho de cada hum ano.” 
(DGARQ-TT, Chancelaria de D. José I, L. 68, ff. 9-9v)

Igualmente em 15 de Maio de 1778 a Rainha D. Maria I concede aos Religiosos do Hospício um Alvará de isenção de direitos das lãs e buréis precisos à sua Vestiaria.
(DGARQ-TT, Chancelaria D. Maria I, L. 11, f. 338v).
No ano seguinte em 26 de Novembro de 1779 é-lhes concedida licença para terem uma escola de escrever, ler e contar com uma ordinária de 40$000 réis cada ano para o religioso que reger a dita escola.
(DGARQ-TT, Chancelaria D. Maria I, L. 12, f. 291v).
E em 6 de Junho de 1788 recebem a mercê de continuarem a ter a esmola de 15 arráteis de pimenta, 6 de cravos, 10 de canela, 4 de gengibre e 5 de malagueta.
(DGARQ-TT, Registo Geral de Mercês de D. Maria I, L.24, f. 35)

Saúl António Gomes refere que depois de extinto, em 1834, o edifício e cerca deste Hospício franciscano foram pedidos, pela Junta de Paróquia de Minde, para cemitério, conforme Portaria do Ministério da Fazenda de 29 de Setembro de 1840. (DGARQ-TT — Sala de Referência ou Catálogo, Usuais, Livro 559, p. 384, s. v. Minde. (Antigo Arquivo Histórico do Ministério das Finanças — Hospício de Nossa Senhora da Arrábida de Minde, Caixa 2237)
(Saul António Gomes, «Elementos para a História do Bispado de Leiria nos Séculos XVII e XVIII», in Leiria-Fátima, n.º 36, pp. 333-360)

Na realidade as instalações foram adquiridas por António Carreira Chavinha que mandou demolir o Convento e converteu a Capela em Lagar, a qual foi depois demolida já nos anos 60 do século XX.


(Lavabo da Sala de Refeições do antigo Hospício)

Para mais informações ver artigos:

Fotos, publicadas originalmente em:

RUI M. MENDES
27 de Junho de 2011

ANEXO
As 45 Casas religiosas fundadas no reinado de D. João V (1706-1751), segundo Frei Cláudio da Conceição:

IN Gabinete historico, Volume 11 / Frei Claudio da Conceição, pp. 345-352
«Pelo motivo do bem espiritual dos seus Reinos admittio Corporações Regulares e Congregações novas que não tinhão fundações algumas nelles para que os seus Vassallos tivessem mais estes sagrados refúgios em que se podessem salvar das tempestades do mundo Estabelecerão-se e fundárão as seguintes Congregações:
A dos Agonizantes a Casa de Nossa Senhora das Necessidades na [346] Tomina 1709, com mais três casas
a de Nossa Senhora de Alcance em Mourão 1718
a de Nossa Senhora de Sacaparte na Villa de Alfaiates em 1726
a de S Pedro em Arronches em 1729, todas do Instituto de S Camillo de Lellis
A Congregação das Covas de Monfurado (cujos filhos depois de alguns annos vierão a Professar a 18 de Janeiro de 1739) fez a Casa de Nossa Senhora do Castello em Monfurado 1725, e fez-se segunda fundação na mesma Villa em 1743
A Congregação do Senhor Jesus da Boa Morte, e Caridade que teve princípio com os Monges das Covas de Montemor e o Padre Balthazar da Incarnação fundou com o titulo do mesmo Senhor Casa em Lisboa 1736
Estabelecêrão-se e fundárão os Religiosos Minimos de S Francisco de Paula hum Hospicio com a invocação do seu Sancto Patriarcha em Lisboa por Decreto de 13 de Julho 1717
[347]
Estabeleceo-se, e fundou a Congregação da Missão o Seminário de S João e S Paulo em Lisboa por Alvará de 14 de Janeiro de 1717, e por estar quasi frustrada a fundação concedeo ElRei licença no dia 26 de Julho de 1738 para ella ficar sujeita ao Superior Geral da mesma residente em Paris Veja se o Tomo IX a fol 342. Nesta Casa fazem os exercícios espirituaes não só as pessoas que se querem apartar das erradas máximas do século e chorarem seus peccados trilhando as veredas da virtude mas particularmente os que estão para receber as Ordens Sacras pois tanto convém a elles como ao Estado da Igreja entrarem com as Consciências puras em o exercício desta grande Dignidade Tão efficaz erão desejo que o Senhor Rei D João V tinha do aproveitamento espiritual dos Portuguezes
Deo licença a 22 de Novembro de 1746 aos Mercenários para novo Hospício largando o antigo [348] que era no Bairro do Mocambo e começárão a edificar o novo na Freguezia de S José em Março de 1747
Da fundação do Louriçal veja se o Tomo V fol 290
Fundação da Real Basílica de Mafra o Tomo VIII
Real Casa das Necessidades o que fica dicto
Os Religiosos Agostinhos Descalços fizerão o Convento de Nossa Senhora do Bom Despacho em Mampedroso no Porto 1745
o Hospicio de S Nicoláo Tolentino em Mora 1711
o de Nossa Senhora dos Anjos em Grândola 1727
o de Jesus Maria em Coimbra 1731
o de Sancta Rita em Lisboa 1748
Os Religiosos Capuchos da Província de Sancto António o Convento do Cardal no Pombal 1707
Os da Província da Conceição o Convento de Sancto António em Ponte de Lima 1707
outro da mesma Província com a invocação do mesmo Sancto em Pinhel em 1731
[349]
o Hospício de Nossa Senhora da Conceição em Lisboa 1708, fundação do Infante D Francisco Tomo IX a fol 316
O Collegio de Sancto António da Estrella em Coimbra em 1707 e lançando-se-lhe a primeira pedra no alicerce da Igreja em 29 de Março de 1715 pelo Bispo daquella Cidade D. António de Vasconcellos e Sousa nella se disse a primeira Missa em 13 de Março de 1717
Os Religiosos Arrábidos o Hospício de Sancta Anna em Minde 1731
Os Religiosos Carmelitas Descalços o Convento de Nossa Senhora do Carmo em Tavira 1745
As Religiosas da mesma Ordem o Convento de Sancta Theresa em Coimbra 1748
Os Religiosos Allemães de S João Nepomuceno em 1737, Tomo VII fol 124
O Convento de Sancta Apollónia das Religiosas de Sancta Clara de Lisboa 1718, Tomo VII, fol 74
[350]
A Conceição de Maria o Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição em Arrifana de Sousa no anno de 1716
Os Religiosos de S Francisco da Cidade Província de Portugal o Convento de S Francisco em Mezão Frio em 1734
E o do Sancto Christo em Almeida no mesmo anno
Os Capuchos da Província da Soledade o Convento de Sancto Antonio que he Enfermaria no Porto em 1735
As Religiosas da Sanctíssima Trindade o Convento de Nossa Senhora dos Remédios em Campolide 1720, Tomo VII, fol 118
Os Religiosos da Província dos Algarves terceira fundação na Villa de Campo Maior 1708
A igreja do Menino Deos 1737, Tomo VI, fol. 34
O Recolhimento da Madre de Deos erecto em Convento na Villa de Guimarães 1716, Tomo VI. fol. 394
[351]
A Igreja de Extremoz 1726, Tomo VII, fol. 207
O Convento da Senhora da Penha de França das Religiosas Capuchas Descalças em Braga 1727, Tomo VII, fol. 276
Recolhimento no Campo de S. Lázaro na Cidade do Porto 1722, Tomo IX, fol. 89
Recolhimento de Nossa Senhora da Conceição na Villa de Aldêa Galega 1735, Idem, fol. 90
Igreja do Senhor da Pedra 1747, Tomo X, fol. 61
Recolhimento de Lazaro Leitão Aranha 1747, Idem, fol. 172
Igreja de Campo Maior 1749, Idem, fol. 343
Os Religiosos Italianos Capuchos em Sancta Apollonia 1739
Hospício dos Monges de S Bruno em Lisboa 1719,
Hospício de Nossa Senhora dos Anjos em Lisboa dos Missionários Apostólicos de Varatojo 1725
Os Eremitas da Immaculada Conceição e Suffraganeos das Almas [352] do Purgatorio na Villa de Cachim [Chacim] na Província de Traz os Montes Nossa Senhora de Balsemão 1732

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